Bronquiolite: o que o plantonista pediátrico precisa saber

Entre os diversos desafios que surgem durante os plantões pediátricos, poucos causam tanta apreensão quanto a bronquiolite. Se você é estudante de medicina ou médico em início de carreira, certamente já ouviu falar desse quadro que costuma assustar até os mais experientes. 

O que é bronquiolite

A bronquiolite é uma infecção das vias aéreas superiores que atinge principalmente lactentes. Na maioria das vezes, ela é causada pelo vírus sincicial respiratório, o conhecido VSR. A doença pode se manifestar de formas variadas, desde quadros assintomáticos até apresentações graves. Em bebês, esse risco é ainda maior, por isso o cuidado com o contato entre crianças, especialmente em ambientes como creches, deve ser redobrado.

Quando ocorrem mais casos

A bronquiolite tem uma sazonalidade bem definida. Em outras palavras, ela aparece com mais frequência em certas épocas do ano, e isso varia de acordo com a região do Brasil. No Sul, os casos aumentam entre abril e agosto. No Norte, o primeiro semestre é o período mais crítico, com pico em abril. Nas regiões Sudeste, Norte e Centro-Oeste, o aumento da incidência costuma ocorrer entre março e julho.

Se você está atendendo pacientes nessa época do ano, mantenha o alerta. É provável que você se depare com diversos quadros clínicos relacionados a essa virose.

Sinais e sintomas

O início da bronquiolite se assemelha a um resfriado comum. A criança apresenta coriza, espirros, obstrução nasal, febre e tosse. No entanto, o quadro pode evoluir rapidamente. Quando a doença progride, a criança começa a apresentar chiado no peito, ou seja, sibilância. Esse chiado geralmente representa o primeiro episódio do tipo na vida do paciente.

Com a evolução do quadro, surgem sinais mais preocupantes como taquipneia e dispneia. Nessa fase, o esforço respiratório passa a ser evidente. Este é um ponto de atenção essencial. A presença de esforço respiratório indica que o risco de complicações aumentou, e o profissional deve avaliar com cuidado a possibilidade de internação.

Critérios de internação segundo a Sociedade Brasileira de Pediatria

A decisão de internar um paciente com bronquiolite não deve ser tomada apenas com base no desconforto respiratório. A Sociedade Brasileira de Pediatria define critérios específicos para orientar essa conduta. Devem ser considerados para internação:

-Apneia

-Queda do estado geral

-Desidratação

-Recusa alimentar ou redução importante da diurese por mais de 12 horas

-Presença de comorbidades, como cardiopatias

-Idade inferior a três meses

-Condições sociais desfavoráveis, como dificuldade de acesso a unidades de saúde

É importante lembrar que muitos pacientes vivem em áreas remotas e podem demorar horas para chegar ao pronto atendimento mais próximo. Por isso, nem sempre é seguro liberar a criança para casa. Às vezes, o mais prudente é mantê-la sob observação por tempo suficiente para garantir estabilidade clínica antes da alta.

Diagnóstico: confiança no exame clínico

O diagnóstico da bronquiolite é essencialmente clínico. Na maioria dos casos, não há necessidade de exames laboratoriais como hemograma ou PCR. Esses exames só são indicados quando existe suspeita de complicações secundárias, como infecção bacteriana associada.

Se houver dúvida quanto ao diagnóstico, a radiografia de tórax pode ser útil. É importante lembrar que, em crianças pequenas, o timo é frequentemente visível e não deve ser confundido com alteração patológica. A imagem radiológica clássica da bronquiolite mostra infiltrado bilateral e retificação dos arcos costais. Ainda assim, o raio-x deve ser utilizado como ferramenta de apoio e não como critério isolado para o diagnóstico.

Manejo clínico: o que deve ou não ser feito

O tratamento da bronquiolite deve seguir condutas baseadas em evidência. A Sociedade Brasileira de Pediatria, por meio de suas diretrizes sobre o manejo do vírus sincicial respiratório, orienta quais intervenções são eficazes e quais não trazem benefício.

Entre as condutas não recomendadas, estão os broncodilatadores como o salbutamol. Eles não apresentam benefício comprovado nos casos típicos de bronquiolite em lactentes. No entanto, é comum observar seu uso na prática clínica, especialmente como teste terapêutico. Quando se trata de uma criança um pouco maior que responde ao salbutamol com melhora significativa, a medicação pode ser mantida durante a internação ou até prescrita para casa.

Corticoides como prednisolona, hidrocortisona e metilprednisolona também não têm indicação na bronquiolite. A fisioterapia respiratória só é indicada em pacientes que apresentam comorbidades. Antibióticos e adrenalina não devem ser utilizados nesses casos. Eles só são indicados se houver suspeita de pneumonia ou laringite, respectivamente.

Entre as condutas recomendadas, destaca-se a importância de manter a criança em repouso. Quanto mais agitada, mais taquipneica ela fica. Isso prejudica a recuperação e sobrecarrega o sistema respiratório. O ideal é deixá-la tranquila e confortável, poupando seu pulmão.

A oxigenoterapia é indicada quando a saturação de oxigênio está abaixo de noventa por cento. Algumas diretrizes aceitam até noventa e dois por cento como limite. Acima desses valores, em ar ambiente, geralmente não há necessidade de intervenção.

Conclusão

A bronquiolite é uma condição que exige atenção e preparo, principalmente durante os períodos de maior incidência. Com um olhar clínico bem treinado e conhecimento das diretrizes, é possível manejar esses casos com segurança. O segredo está em reconhecer os sinais de alerta, evitar intervenções desnecessárias e respeitar os limites e necessidades de cada paciente.


Autor: Matheus S. Fassarella
Médico pela Faculdade Multivix, Pediatra pela Santa Casa de Misericórdia de Vitória, Preceptor de Residência Médica em Pediatria pelo Hospital Infantil de Vitória (HINSG) e professor do PS Zerado.

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