A fibrilação atrial (FA) é uma das arritmias mais comuns no PS, e o manejo adequado dessa condição é essencial para evitar complicações graves. No último Congresso Europeu de Cardiologia, realizado em agosto e setembro de 2024, foram apresentadas importantes atualizações nas diretrizes sobre FA. Entre elas, destacam-se mudanças no critério de anticoagulação e no tempo para indicação de cardioversão. Vamos entender melhor essas novidades e como elas impactam o atendimento no pronto-socorro.
O Mnemônico CARE: A Nova Abordagem para FA
As novas diretrizes propõem uma abordagem sistemática baseada no mnemônico CARE, que ajuda na condução do paciente com FA em diferentes contextos, incluindo pronto-socorro, UTI, ambulatório e enfermaria.
- C – Comorbidades: Controle adequado de hipertensão, diabetes e outras doenças que podem levar a complicações cardiovasculares.
- A – Anticoagulação: Novo critério de indicação, sem a diferenciação entre homens e mulheres.
- R – Redução de Sintomas: Controle de frequência e ritmo para melhora clínica.
- E – Evaluation (Avaliação): Seguimento ambulatorial para monitorar a eficácia da anticoagulação e avaliar a necessidade de ablação.
No contexto do pronto-socorro, os dois pontos mais importantes são anticoagulação e redução de sintomas.
O Fim do CHADS-VASC: Bem-vindo, CHADS-VA!
Até a última diretriz, o escore CHADS-VASC era utilizado para avaliar a necessidade de anticoagulação em pacientes com FA. No entanto, uma das maiores críticas a esse escore era a pontuação atribuída ao sexo feminino, que não fazia sentido clínico.
Com a nova diretriz, o escore CHADS-VASC foi substituído pelo CHADS-VA, eliminando o critério de sexo feminino. Agora, a pontuação leva em consideração os seguintes fatores:
- C: Insuficiência cardíaca (1 ponto)
- H: Hipertensão arterial (1 ponto)
- A2: Idade ≥ 75 anos (2 pontos)
- D: Diabetes mellitus (1 ponto)
- S: Evento vascular prévio (AVC, AIT, tromboembolismo) (2 pontos)
- V: Doença vascular estabelecida (1 ponto)
- A: Idade entre 65 e 74 anos (1 ponto)
A indicação de anticoagulação segue a seguinte regra:
- ≥2 pontos: Anticoagulação indicada para todos os pacientes.
- 1 ponto: Decisão individualizada.
- 0 pontos: Não anticoagular.
Com essa mudança, a avaliação se torna mais objetiva e padronizada para todos os pacientes, independentemente do sexo.
Cardioversão: Mudança no Tempo e nos Critérios
Outra atualização importante está na indicação de cardioversão para pacientes com FA aguda. Antes, o tempo recomendado para realizar a cardioversão era de 48 horas após o início do quadro. Agora, esse tempo foi reduzido para 24 horas, devido ao risco aumentado de eventos tromboembólicos.
No entanto, ainda é possível realizar a cardioversão após 24 horas em algumas situações:
- Pacientes com ETE negativo: O ecocardiograma transesofágico (ETE) descarta a presença de trombo nas cavidades cardíacas e permite a cardioversão segura.
- Pacientes anticoagulados por pelo menos 3 semanas: Se o paciente está em uso regular de anticoagulantes como rivaroxabana ou varfarina, a cardioversão também pode ser realizada.
Quanto ao método de cardioversão, segue-se a seguinte abordagem:
- Cardioversão elétrica: Indicada para pacientes instáveis hemodinamicamente (angina, rebaixamento do nível de consciência, choque, sepse).
- Cardioversão medicamentosa: Para pacientes estáveis, podendo ser utilizada propafenona ou amiodarona.
Atenção! A propafenona não deve ser usada em pacientes com doença estrutural do coração (cardiopatia, doença arterial coronariana ou DPOC grave). Nesses casos, a amiodarona é a melhor opção.
Essas mudanças têm o potencial de melhorar o manejo da FA no PS, tornando a abordagem mais simples e segura. Se você trabalha na emergência, fique atento a essas atualizações e aplique-as na sua prática clínica!
Referência European Society of Cardiology (ESC). (2024). 2024 Diretriz ESC para diagnóstico e manejo da fibrilação atrial. European Heart Journal. Disponível em https://www.escardio.org/Guidelines
Autor: Tammer Ferreira Zogheib
Médico pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Clínico Geral pelo Hospital Evangélico de Vila Velha (HEVV), Médico das Unidades de Internação do Vitória Apart Hospital, Docente no curso de Medicina da Faculdade Multivix Vitória-ES, Professor do PSZerado.